Um dia o inevitável momento acontece: sentir-se só, em cima do palco, com a luz a dar directamente contra os olhos e tudo o que se enxerga é penumbra e sombras. Desconforto, imobilidade e exclusão.
Há sempre um preço a pagar pela autenticidade. E este é um excelente legado e lição para transmitir ao meu filho.
Ter mais tempo, ter mais tempo e ter mais tempo.
Por favor, não me digam para estabelecer prioridades. Elas existem e comandam.
Eu queria ter mais tempo para o que fica de fora da lista de prioridades, espaço do dever. Neste espaço relegado para "mais tarde" está contido e reprimido o não fazer nada e o fazer tudo de que gostamos.
...mas ela sabe que há o outro lado de si mesma. O lado da ferocidade. Devora cada página com a ansiedade de uma paixão incontrolável. Cada página é movida por dedos de vento que uivam e assobiam ao ritmo da chuva que derrama-se pela janela. A vela ilumina e aquece a noite. E ela enrola-se ao livro e despede-se da realidade.
"Se me queres falar, se me queres dizer algo, se me queres conquistar, tens de fazê-lo através de tuas palavras de tinta e de papel.", ela pensa entre (...)
Ela diz com olhos brilhantes que o livro é lindíssimo e não consegue conter o seu entusiasmo. Perde-se nas palavras, nas páginas, ouve os risos, o barulho do vento a uivar na janela e consegue até enxergar os penhascos. Ela está tão apaixonada pelo que lê que esquece o mundo ao redor. O verdadeiro antídoto para o desconsolo. Quando adormece, pensa no que leu. Sonha e vive.
Quem a ouve não entende, não consegue perceber o porquê do seu entusiasmo. Algo inventado pode ter (...)
Esta firme certeza de que há coisas que me escapam totalmente ao alcance das mãos. Esta convicção de que não posso resolver tudo e de que fazer o que é correcto não implica necessariamente um resultado positivo. Esta sensação de vulnerabilidade e fragilidade. Esta clara visão de que tenho de confiar e seguir em frente.
Ter 36 anos não faz de mim alguém melhor. É mais do que eu pensei poder alcançar. Bem mais.
Ter 36 anos torna-me alguém consciente dos meus limites, estou bem perto deles. Bem perto. Demasiado perto.
Ter 36 anos ensinou-me a ver quem me ama de verdade. São poucos. Os verdadeiros nunca se esquecem de mim. Nunca.
Ter 36 anos e estar em contagem regressiva.
Hoje não me sinto bem. Não costumo escrever assim tão claramente, mas hoje não me sinto bem. Nada bem.
Hoje não (...)
"Tem as tensões demasiado altas e o batimento cardíaco muito acelerado. Está parada e parece que vai a correr apanhar o comboio.".
Fico estática. Parada. Sem qualquer palavra.
Eu poderia ter dito que o meu coração é um órgão de fogo e de diversas intensidades. Mas ele era um médico e talvez não fosse conveniente dizer-lhe isso.
[ eu gostaria muito de ser mais positiva a escrever. com muitos corações a voar e pássaros a cantar. com um trio de cordas no fundo a tocar. que cada palavra soasse como uma bela melodia. sinto muito, a vida não é assim. a vida não é só isto, mas também é. quando as coisas positivas, belas e agradáveis acontecerem; procurarei falar sobre elas. para já, imaginem este parágrafo sendo escrito com som de trovões ao fundo. é o mais suave que eu consigo me posicionar neste momento. ]