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Chá de Menta

I am half agony, half hope | Jane Austen

Chá de Menta

I am half agony, half hope | Jane Austen

( BICENTENÁRIO "SENSE AND SENSIBILITY" )

15.01.11, a dona do chá

Uma das coisas boas que me aconteceram, neste início do ano, foi um convite/desafio muito aliciante e amável feito pela Raquel Sallaberry.

 

A propósito do Bicentenário de "Sense and Sensibility" de Jane Austen, ela me propôs fazermos uma leitura conjunta e comparada da obra na tradução portuguesa (Sensibilidade e Bom Senso, tradução de Maria Luísa Ferreira da Costa) e na tradução brasileira (Razão e Sentimento, tradução de Ivo Barroso). Este convite foi uma surpresa agradável e sinto-me muito honrada. O meu entusiasmo está em alta.

 

Os textos da Raquel serão publicados no "Jane Austen em Português" e os meus textos serão publicados no "Jane Austen Pt". Mas sempre que publicarmos algo eu colocarei a chamada com links para os respectivos locais aqui.

 

Convido a todos a acompanhar a leitura deste desafio. Acredito que vai ser um ano lindo.

( já vai o ano bem lançado... )

15.01.11, a dona do chá

... e somente agora preparo-me para escrever o meu balanço do ano que passou. Tenho mastigado muitas coisas no meu pensamento. Tenho tentado entender e tenho tentado depurar factos e circunstâncias.

 

Este ano que passou teve de tudo: coisas boas e coisas más. Não posso dizer que a co-existência de ambas as coisas seja algo negativo. Aprendemos com tudo. Há coisas difíceis de digerir mas, regra geral, permaneço de pé. Tenho esta sensação de gratidão por tudo o que tenho vivido. Parece que ouço ao ouvido uma voz que me diz que é assim mesmo, que tem de ser assim, que tenho de ver e viver determinadas coisas. Que tenho de ver o que há de belo e que tenho de encarar o que é desprezível. Os meus olhos têm encarado a imperfeição do que seria de esperar ser intocável e a perfeição das coisas breves e dos momentos únicos.

 

O pior do ano que passou: a operação e recuperação do meu pai. Foi horrível. Foram momentos literalmente viscerais e insones. Ainda são. Se dentro deste processo está a gratidão de ter visto o milagre dele ter sobrevivido a uma operação delicada; por outro lado, está esta pequena revolta de vê-lo a voltar a velhos hábitos que o irão levar consequentemente ao mesmo estado anterior. Como se ele recebesse de presente um baú com um tesouro e ele simplesmente cuspisse de volta. Por muitas voltas que dê ao meu pensamento não consigo perceber alguém que está perto da morte, sente-lhe o cheiro, escapa, recupera bem e agora inverte todo o processo. Não percebo. Sinceramente, não estou sequer com vontade de perceber.

 

O melhor do ano: as viagens que eu e o G. fizemos. Principalmente, a últimas. Depois de 19 anos, voltei a pisar o solo brasileiro. Foi uma amálgama de sensações. Ainda irei falar sobre isso. Mas foram dias lindos e de desmistificação. Cheguei ao fim atordoada e mas algumas certezas das quais eu não estava à espera de alcançar... Tem sido bom.

 

As amizades: Este foi um ano revelador no que diz respeito às amizades. Hoje, aqui e agora - sei com quem posso contar. Distingo bem quem são conhecidos, colegas, amigos e AMIGOS. Quando eu precisei eles estavam presentes. E o estar presente não tem haver com tempo e espaço. Não tem haver com proximidade física. Tem a ver com dedicação, amor, compromisso e altruísmo.

Não posso deixar de falar também nas pessoas tão interessantes e tão amáveis que tenho conhecido por este mundo virtual. A Cássia, que me convidou para participar do Clube de Leitura, tem sido uma amizade virtual muito querida para mim. De igual forma, a Clara, que aceitou a minha colaboração no Jane Austen PT, tem sido um amor e um pessoa espectacular - ela teve a visão de criar este blogue sobre Jane Austen e participar lá tem superado as minhas espectativas.

 

Guardo esta esperança e vontade de que este ano - 2011 - vai ser ainda melhor. O que vier de menos positivo, lá terei de enfrentar. A vida é isto mesmo. Um dia de cada vez e cada coisa no seu lugar.

( crónicas do Rio 2 )

13.01.11, a dona do chá

A despedida começa no momento da chegada. Dentro daquele misto de ansiedade, expectativa e euforia da chegada, há um pequeno instante de consciência da verdade: de que a alegria da chegada em breve dará lugar a dor da despedida.  Uma verdade outrora cantada pelo Poeta. Naquele breve momento de encontro de olhares e de reconhecimento de rostos tão queridos, sabemos de antemão que haverá o desencontro.

 

Três dias antes da partida, este conhecimento torna-se tão latente e tão intenso que somos  perseguidos pelo gosto salgado da saudade. Não sabiam? A saudade terá sempre sabor a sal. Esta saudade que carrego entranhada na pele é revestida de sal e liquefaz-se constantemente.

Lentamente, os olhos prendem-se mais minutos do que seria necessário nas pessoas, nos gestos, em cada canto da casa. Então, três dias antes da partida, o abrir e o fechar de olhos é um processo de memorização. Fotografo na minha mente os azulejos que compõe uma das casas da minha infância. Absorvo cada sorriso, gargalhada, palavra e abraço. Os meus olhos prendem-se a cada pedaço e formo uma nova lembrança. E abraço e beijo e digo que amo e choro e choro desalmadamente como uma criança e sei que vou chorar ainda mais porque não quero partir e porque tenho de partir e porque partir é inevitável.  E abraços os meus padrinhos e choro. Abraço as minhas primas e choro. Abraço mais umas três ou quatro vezes porque, no fundo, não quero partir. Não quero viver pela metade. Não quero que as pessoas que eu mais amo estejam tão longe de mim.

 

Três dias antes da partida já sentia o peso.

 

Estes três dias intensificaram-se. Parecia que gritavam aos meus ouvidos.  Como vou conseguir partir? Como vou conseguir deixá-los? Os olhos percorrem freneticamente cada centímetro dos meus amados. Tiro fotografias mentais. O meu irmão a fazer café de saco. A minha cunhada com o Samuel ao colo. A Carol com olhinhos de sono. O meu irmão a rir. A minha cunhada também a rir. Os meus sobrinhos - adivinhem - também a rir. Um sorriso bonito e pleno. Um sorriso de família.  A tristeza da partida avassala-me. Sinto-me fraca. Sinto-me frágil. Sinto que o tempo me escapou pelas mãos. Penso: Não posso ficar mais um dia? Não posso prolongar esta sensação de felicidade? Sinto-me embriagada de felicidade.  Tenho mesmo de partir?

 

No dia anterior, vejo a pequena Carol com olhos de saudade e desato a chorar. Vejo a Rosi com olhos também de saudade e persisto em chorar.

 

O dia chega. As horas avançam.

 

Os meus olhos prendem-se novamente às pessoas que amo. Ajoelho no chão ao lado da minha irmã e cunhada, que já não resiste ao sabor a sal da saudade e abraço-a. Garanto-lhe que foi tudo perfeito. E foi.  Abraço e beijo e digo que amo e choro e choro desalmadamente como uma criança e sei que vou chorar ainda mais porque não quero partir e porque tenho de partir e porque partir é inevitável.  E abraço a minha irmã, abraço os meus sobrinhos, abraço o meu irmão. E choro. Abraço mais umas três ou quatro vezes porque, no fundo, não quero partir. Reafirmo,  não quero viver pela metade.

 

A última imagem que vejo são eles todos juntos acenando para nós. E a figura tão pequenina e tão linda da minha sobrinha a chorar de braços estendidos para mim. O meu coração se dissolveu. Ficou completamente aniquilado. A viagem de regresso que, por si só é longa, pareceu eterna. Não havia nada que me consolasse. Nada. Na chegada, a primeira coisa que pensei foi "parece que tudo foi um sonho".  Demorei muito a digerir a chegada e a partida e "re-chegada". Só conseguia sentir a saudade que a distância impõe. Esta vastidão…

 

Sei que formei uma nova lembrança no meu coração. Sei que vivi estes dias de felicidade. E ainda irei falar sobre isso, sobre a felicidade e sobre os dias que vivi neste retorno às origens. Sei que reforcei afectos, estreitei laços e desmistifiquei ilusões. Demorei um pouco a conseguir a me restaurar da felicidade que vivi. Não é estranho termos de nos refazer da felicidade? É muito estranho…  Vejo nitidamente que tenho recebido mais do que mereço. Que os meus olhos têm seguido horizontes indefinidos. O meu coração tem estado um pouco descompassado mas continua teimoso. Resiste em não desistir. Pelo contrário, busca prosseguir. Sempre em frente. De repente, sem mais nem menos, pode ser que voltemos a estar todos reunidos. De repente, sem mais nem menos, talvez voltemos a viver estes momentos inesquecíveis. Para já, acredito que podemos encontrar o equilíbrio entre a distância, a saudade e o sentimento. O equilíbrio é entender no que consiste o nosso papel no mundo. Não sei bem qual é o meu. Mas este é o combustível: saber que tenho um caminho a percorrer.

 

Há o início e há o fim. A saudade é intrínseca. Está algures em tudo o que vivi. Está no entretanto.

( Chego aos 35 )

06.01.11, a dona do chá

Chego aos 35 anos ainda meio tonta, meio sem acreditar. Nunca me imaginei com 35 anos e ainda a ter um coração que bate com a mesma intensidade dos 15 anos. Chego aos 35 anos desperta para a realidade que me cerca. Consciente de que tenho algo em mim que faz sentir tudo com grande paixão e intensidade. Chego aos 35 anos com mais sede de viver. Com os olhos repletos de capacidade de deslumbramento. Chego aos 35 anos a tentar deixar para trás o que não interessa e a buscar sempre o que é correcto. Tenho a certeza de que persigo o caminho da justiça, da bondade, da gentileza, dos gestos suaves mas firmes. Busco a simplicidade. Mantenho a minha certeza de é mais importante ser do que ter. Não busco bens materiais, interesses, posses. Procuro a relevância. Procuro a constância. Procuro a consistência. Procuro ser útil. Procuro a criatividade. Procuro transmitir este amor que Deus colocou no meu coração pelo próximo. Chego aos 35 anos a acreditar que, mesmo sendo este mundo tão agreste, devemos semear o amor. E o amor, tenho visto, tem a medida correspondente de sacrifício.

Mas se tenho visto e vivido coisas tristes também tenho tido uma boa quota de momentos lindos e inesquecíveis. Aprendo com tudo isto e o meu coração agradece este aprendizado.

Então, chego aos meus 35 anos de idade assim meio boba e com convicções fora de moda.

Chego aos 35 anos, acima de tudo, grata.

Estou grata pelo meu marido, pela minha família, pelos meus amigos, pelos meus amigos "virtuais", pelas novas amizades que fiz, pelas experiências que vivi, pelos dias de sol, pelo Rio de Janeiro em fim de tarde... tantas coisas, são tantas coisas.

Hoje não peço nada. Na realidade, não preciso de nada. Somente preciso de transmitir esta gratidão que acelera o compasso do meu coração.

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