Ela diz que eu vivo o sentimento de luto por antecedência. Que sofro como se cada vez que acontece fosse a derradeira. Eu nunca havia pensado nisso. Agora penso demasiado. Ela me pergunta o que vai mudar na minha vida se o pior acontecer e, também, o que irá acontecer se o melhor se verificar. Eu não lhe sei responder. “Sei lá”, digo. Tenho pensado bastante nisso. A resposta continua a mesma. Não sei. Como prever uma reacção?
Outra pessoa me diz que tenho de manter a esperança. Eu olho-a e digo que não. Talvez porque não entenda totalmente o que é isto de ter esperança. Mas lembro do gosto amargo da queda na pós-esperança. Limito-me a dizer-lhe que não, que não tenho esperança. Prefiro não ter. Se tudo correr bem, fico feliz. Se correr mal, estou a meio caminho de não sofrer na totalidade. Eu quero que tudo corra bem, que ele fique bem, que todos fiquemos bem. Que a nossa família permaneça sempre. Mesmo com todos os nossos defeitos. Mas querer isto não me cega os olhos para o possível quadro. Nesta altura, questiono-me: há forma de me auto-controlar diante de uma possível perda. Terei capacidade de superar? Não seria a primeira vez a experimentar a perda, quando andávamos sobre aquele chão verde. Tento viver cada dia, fazer o meu melhor e procurar afastá-lo de si próprio. Ele e a sua fraqueza são os seus principais inimigos.
A vida tem estado em suspenso até que a operação ocorra. A vida e o coração correm, desafiam cada dia com indiferença como se as horas não fossem um obstáculo. Eu não consigo segurar nada, nem a vida nem o coração e nem as horas.
Prossigo.
Sistematicamente.